Congresso da SMBA - Novembro 2006
As síndromes dolorosas e disfuncionais de origem não-infecciosa da bexiga muitas vezes não respondem bem aos tratamentos farmacológicos e cirúrgicos.
Uma nova modalidade de tratamento, fundamentada na fisiologia e na neuroanatomia do controle neural da função vesical, tem proporcionado resultados satisfatórios em muitos casos. São os métodos baseada em eletro-neuro-estimulação, que representam um importante avanço no tratamento da dor e disfunções urinárias.
Entre as síndromes tratáveis com sucesso pelo método, incluem-se: bexiga hiperativa, cistite intersticial, incontinência e retenção urinária, enurese e bexiga neurogênica.
As técnicas mais importantes são eletro-neuro-estimulação sacral e do nervo tibial posterior. Atualmente, uma das modalidades mais referenciadas nos periódicos de Urologia é a chamada neuromodulação sacral por meio de eletrodos implantáveis [Spinelli M. Chronic sacral neuromodulation in patients with lower urinary tract symptoms: results from a national register. J Urol 166(2): 541-5. Aug 2001].
Entretanto, o uso de dispositivos não-implantados, também é eficaz, e deveria preceder o uso de dispositivos implantados, um procedimento invasivo e de alto custo Brubaker L. Electrical stimulation in overactive bladder. Urology 55(5A Suppl): 17-23; discussion 31-2. May 2000].
Bexiga hiperativa
Freqüentemente associada com a resposta ao stress, a síndrome da bexiga hiperativa é uma queixa comum, que afeta 20 milhões de norte-americanos. Caracteriza-se por micções freqüentes, urgência miccional, dor pélvica e noctúria, afetando tanto homens quanto mulheres.
O tratamento por meios farmacológicos é pouco eficaz, enquanto as técnicas de estimulação neural periférica oferecem resultados positivos.
Cistite intersticial
Doença crônica recidivante, cujos sintomas incluem dor pélvica crônica, aumento da freqüência urinária, urgência e noctúria, muitas vezes o diagnóstico demora a ser realizado, porque os sintomas se confundem com infecção urinária recorrente, síndromes de dor pélvica crônica, prostatite crônica, ou às vezes são atribuídos a distúrbios psicológicos.
Não há um tratamento isolado que resulte em melhora completa em todos os pacientes, e a doença pode retornar depois de períodos de remissão.
Paula M. Lyons, MD. Acupuncture Treatment For Interstitial Cystitis: A Case Report. Medical Acupuncture vol14:43-45. 2003
Incontinência urinária
A condição, que afeta principalmente as mulheres idosas, é de tratamento difícil, tanto por meios farmacológicos quanto cirúrgicos. A eletro-neuro-estimulação é um recurso importante para esses casos.
Bergstrom K., Carlsson C.P., Lindholm C., Widengren R. Improvement of urge- and mixed-type incontinence after acupuncture treatment among elderly women - a pilot study. J Auton Nerv Syst 15;79(2-3):173-8. Mar 2000
Enurese
Diversos estudos clínicos têm demonstrado a eficácia da eletro-neuro-estimulação no tratamento da enurese.
Honjo H, Kawauchi A, Ukimura O, Soh J, Mizutani Y, Miki T. Treatment of monosymptomatic nocturnal enuresis by acupuncture: A preliminary study. Int J Urol 9(12):672-676 Dec 2002
Retenção urinária / Bexiga neurogênica
Mesmo nos casos de lesão medular, em pacientes com instabilidade ou hiper-reflexia do detrusor da bexiga, a eletro-neuro-estimulação tem se mostrado um recurso valioso.
Bosch R.J.L.H. Groen J. Neuromodulation: urodynamic effects of sacral (S3) spinal nerve stimulation in patients with detrusor instability or detrusor hyperflexia. Behavioural Brain Research 92:2:141 – 150. 1998
Wyndaele J.J. Conservative treatment of the neuropathic bladder in spinal cord injured patients. Spinal Cord -; 39(6): 294-300. Jun 2001
Klingler H.C. Use of peripheral neuromodulation of the S3 region for treatment of detrusor overactivity: a urodynamic-based study. Urology 56(5): 766-71. Nov-2000
Hasan ST, Robson WA, Pridie AK, Neal DE. Transcutaneous electrical nerve stimulation and temporary S3 neuromodulation in idiopathic detrusor instability. J Urol 1996; 155: 2005–11
Bower WF, Moore KH, Adams RD, Shepherd R. A urodynamic study of surface neuromodulation versus sham in detrusor instability and sensory urgency. J Urol 1998; 160: 2133–6
Walsh IK, Johnston RS, Keane PF. Transcutaneous sacral neurostimulation for irritative voiding dysfunction. Eur Urol 1999; 35: 192–6
Neuromodulação sacral
O método se distingue de outros tipos de neuromodulação pela estimulação continuada e contato íntimo com o nervo, sendo o sítio de estimulação próximo da medula espinal.
Um aspecto característico é a implantação de um gerador de pulsos e de um eletrodo para estimular uma das raízes sacrais S3. Esses nervos têm uma representação maior na bexiga do que os nervos de S4, e causam menores efeitos colaterais para os membros inferiores do que os nervos de S2.
Groen J., Bosch J.L.H.R. Neuromodulation techniques in the treatment of the overactive bladder. BJU International (May 2001), 87.8
Mecanismos
Neuroestimulação sacral (neuromodulação) pode restaurar normalidade sensorial da bexiga e na capacidade de urinar em mulheres com retenção urinária devido a hiperatividade esfincteriana (síndrome de Fowler). A modulação central de aferentes é considerada crítica para esse efeito terapêutico. Foi utilizada Ressonância Magnética funcional para determinar como a neuromodulação atua sobre centros cerebrais envolvidos com o controle da função vesical.
As mulheres com retenção urinária mostraram aumento da atividade límbica quando a bexiga estava cheia, em ausência de neuromodulação. O procedimento restaurou um padrão normal da atividade mesencefálica e diminuiu a atividade cortical.
O estudo mostrou a existência de interação anormal entre o tronco cerebral e centros corticais em mulheres com retenção urinária, e revelou que o efeito terapêutico da neuromodulação sacral é obtido por meio da restauração da atividade associada com a auto-regulação do tronco cerebral e atenuação da atividade do córtex cingulado.
Dasgupta R., Critchley H.D., Dolan R.J., Fowler C.J. Changes in brain activity following sacral neuromodulation for urinary retention. J Urol Vol. 174, 2268–2272. December 2005
Estimulação do nervo tibial posterior
Em 1983 foi publicado o primeiro relato de experiência bem sucedida com estimulação do nervo tibial posterior como uma modalidade terapêutica alternativa para o tratamento de pacientes com urgência urinária secundária a instabilidade do detrusor.
McGuire E.J., Shi-Chun Z., Horwinski E.R. Treatment of motor and sensory detrusor instability by electrical stimulation. J Urol 129 : pp 78-79
O procedimento mais utilizado consiste na inserção de agulha entre a margem posterior da tíbia e o músculo sóleos, 3 dedos acima do maléolo medial. A agulha é conectada a um eletrodo que fornece corrente de 9 V, duração de pulso de 200 microssegundos, com intensidade entre 0 e 10 mA, com freqüência de 20 Hz. A estimulação do nervo resulta em resposta sensorial tipo parestesia propagada para a planta do pé, assim como resposta motora – flexão do dedo grande do pé, ou separação dos dedos do pé. Cada sessão tem duração de cerca de 30 minutos.
Van Balken M.R., Vandoninck V., Gisolf K.W. Posterior tibial nerve stimulation as neuromodulative treatment of lower urinary tract dysfunction. J Urol 166 : pp 914-918. 2001
A tolerabilidade do procedimento por parte de crianças representa uma dificuldade para o seu uso pediátrico.
Bani-Hani A.H., Vandersteen D.R., Reinberg Y.E. Neuromodulation in pediatrics. Urologic Clinics of North America Vol. 32 N. 1. Feb 2005
Nesse caso as agulhas podem ser substituídas por eletrodos de superfície (eletro-neuro-estimulação transcutânea). O uso de eletro-neuro-estimulação transcutânea tem sido avaliado em numerosos ensaios clínicos.
Van Laecke E, De Paepe H, Renson C, Raes A, Vande Walle J, Hoebeke P. Transcutaneous neuromodulation in children: preliminary results. Eur Urol 2000; 37 (Suppl. 2): 40
Modulação simpática segmentar
Intervenções na região para-vertebral são eficazes no tratamento de dor visceral, como as cólicas relacionadas com litíase urinária, ou outros transtornos viscerais, através de mecanismos comuns.
Nikiforov S., Cronin A. J., W.
A estimulação neural paravertebral modula a atividade simpática de modo segmentar.
A redução da atividade do sistema simpático obtida por meio de intervenções em sítios da musculatura paravertebral, na altura das vértebras T10 a L2, onde se origina a inervação para a pelve, justifica a indicação do uso dessa técnica no tratamento de dor e disfunção urinária.
Conclusão
O método de eletro-neuro-estimulação para o tratamento de dor e disfunções urinárias, apesar de bem fundamentado e baseado em evidências clínicas, ainda é subutilizado em nossos meios. Constitui-se numa área de atuação para os especialistas em Acupuntura.
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