Os postulados da paleo-medicina chinesa são geralmente expressos em aforismos, usados para descrever os processos das doenças, e os princípios do seu tratamento. Devem ser considerados e tomados como as primeiras evidências, e as únicas existentes até pouco tempo, para fundamentar a prática da Acupuntura. Essas evidências (não se pode falar aqui em comprovações) foram produzidas a partir de dados observacionais, não quantificados nem aleatorizados, e nem controlados. Eram as únicas disponíveis para fornecer diretrizes para o diagnóstico, a prescrição e o modo de usar a Acupuntura.
A partir da década de 1970, têm sido produzidas novas evidências, provenientes tanto do campo da pesquisa em Neurofisiologia, em Neurociência e em modelos de patologia em animais, quanto da pesquisa clínica. As constatações das bases biológicas da Acupuntura foram o primeiro passo para uma investigação que progride na mesma proporção em que as disciplinas científicas envolvidas progridem.
O imenso progresso no conhecimento do sistema nervoso conduziu a um entendimento tal dos efeitos biológicos e terapêuticos da Acupuntura, que acabou por tornar explícito o seu campo de atuação. Delimita-se a sua aplicação, destinando-a aos muitos casos em que a expectativa de resultado significativo justifica considerar o método como a primeira opção para uma condição clínica definida, e ao mesmo tempo ampliam-se as suas possibilidades terapêuticas como método coadjuvante, paliativo ou de apoio em muitas outras situações clínicas.
A conciliação dos dois modelos – tradicional e contemporâneo, não deveria ser problemática, considerando que as explicações e comprovações baseadas em dados científicos apresentam uma superioridade implícita, em relação às que se baseiam em conceitos explicáveis somente enquanto estritamente vinculados a um contexto cultural peculiar, que parte de uma visão do mundo que é comum às civilizações antigas.
Por outro lado, a experimentação pode esclarecer qual é a abordagem, entre diversas, que se prova a melhor. Nunca se admitiu na medicina a aplicação de um método que comprovadamente seja inferior (sob critérios como – eficácia, efeitos adversos, duração, custo) a outro igualmente disponível. Da mesma forma, a Medicina não pode ser étnica nem datada.
A adoção, nos dias de hoje, de um modelo “baseado em crenças”, em troca de um “baseado em evidências”, se configura como uma continuidade ou ressurgimento do movimento vitalista do final do século 18 (explicitamente contrário ao avanço da Ciência como modo de investigar a realidade), ou como uma preservação da contra-cultura dos anos 70, um movimento de resistência à perda dos referenciais primitivos, que explicavam o mundo como uma estrutura simples e linear, com o ser humano no centro do universo.
De qualquer modo, a fundamentação da prática médica em dados científicos é imperiosa, inevitável e inadiável.
O maior obstáculo atual para a integração da Acupuntura no contexto médico-científico é o fato de que o paradigma implicado, o da neuromodulação por estimulação neural periférica, é novo. Tanto para a corrente hegemônica da ciência positivista do século 19, que impõe um retardo na percepção de que o mundo já é outro, quanto para as correntes “tradicionalistas”, para as quais aparentemente o mundo é mesmo outro, mas igual ao que era nos primórdios do processo civilizatório.
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