sexta-feira, 18 de maio de 2012

Sistema nervoso - patologia e terapêutica - dor e transtornos funcionais



http://physrev.physiology.org/content/86/4/1309.full



Conceitos provenientes da investigação das neurociências, são os fundamentos do método de modulação neural periférica, desenvolvido e utilizado há mais de uma década, em diversas partes do mundo.

Considerando a extraordinária capacidade das diversas modalidades de componentes do sistema nervoso periférico, situados em diferentes tecidos além da pele, de responder a intervenções desenhadas para essa finalidade, que provocam mudanças nas suas funções, com repercussões locais, regionais e sistêmicas, sobre vários sistemas controlados pelo sistema nervoso, pode-se deduzir o alcance do método terapêutico.

Controles neurais análogos ao da pele, descritos no artigo referido acima, ocorrem em todos os subsistemas do organismo, e são cruciais para a vitalidade, a funcionalidade, a estabilidade e a capacidade de reposta dessas estruturas. Presentes no tecido conjuntivo (fáscias, tendões, músculos, ossos), no sistema circulatório, nas glândulas em geral, nos sistemas imunitário, digestivo, metabólico, respiratório e urinário, os controles neurais também são responsáveis pela autorregulação do próprio sistema nervoso.

O surgimento dos métodos de modulação neural periférica representa uma revolução na Medicina, nos campos do tratamento da dor e dos transtornos funcionais. Até então, a participação do sistema nervoso não era considerado na gênese e na manutenção da maioria dos problemas de saúde em geral, e muito menos na terapêutica, considerando as propriedades responsivas do sistema nervoso periférico à estimulação e modulação.

O papel do sistema nervoso ainda não entrou nos raciocínios clínicos, e nem faz parte dos currículos da formação médica e de outras profissões da saúde, assim como não está incluído nas chamadas “medicinas alternativas e/ou complementares”.

Embora a Acupuntura, mesmo involuntariamente, consista na aplicação de intervenções sobre o sistema nervoso periférico, não é assim compreendida , permanecendo vinculada aos cânones dogmáticos e fundamentalistas da “Medicina Tradicional Chinesa”. Falha igualmente, por causa disso, em desconsiderar, nos raciocínios diagnósticos, a participação das funções e disfunções do sistema nervoso, e na deixando de ter, na terapêutica, qualquer objetividade na escolha dos alvos adequados para a aplicação dos procedimentos, desprezando a anatomia, a fisiologia e a fisiopatologia.

A falta de consideração pela participação fundamental do sistema nervoso na patogenia e na terapêutica compromete os resultados terapêuticos de qualquer tratamento.

Isso se manifesta na abordagem da Medicina moderna, cujos fundamentos, excetuando-se o desenvolvimento das engenharias aplicadas aos exames e às terapêuticas farmacológica e cirúrgica se estabeleceram no século 19. E também na da Acupuntura que, apesar de ser uma especialidade médica, carece gravemente de racionalidade, tanto em termos de clínica (o entendimento da doença, a fisiopatologia, o diagnóstico e a prescrição de tratamento), quanto em termos de anatomia e fisiologia, e de clareza dos objetivos do tratamento, na escolha das técnicas e dos alvos das intervenções.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

medicamento antigo, tradicional.

um dos mais prescritos ainda hoje para pacientes cujos sintomas não são bem interpretados.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

28% dos moradores de SP dizem conviver com dor crônica

Reportagem da Record traz resultados do primeiro levantamento epidemiológico sobre dor na cidade de São Paulo, conduzido pela Professora Dra. Maria do Rosário de Oliveira Latorre, professora do departamento de epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP.

"A população acredita que a dor faz parte da vida e do envelhecimento, por isso demora para buscar assistência especializada. Isso pode cronificar a dor", afirma Fabíola Peixoto Minson, diretora da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor.  

As mulheres são as que mais sofrem desse mal --35% delas têm dor, contra 20% dos homens.
O coordenador do centro de dor do Hospital Nove de Julho, Claudio Corrêa, tem explicação para isso.
"Uma só doença (que causa dor), a fibromialgia, atinge 2% da população, e são dez mulheres para cada homem. E há as doenças provocadas por mudanças hormonais, que são muito importantes na faixa dos 45 aos 64 anos, como osteoporose e enxaqueca. Essa é, talvez, a dor mais prevalente, e ela atinge bem mais mulheres", afirma. 


Campanha
 
Para Fabíola Minson, é importante criar campanhas para convencer a população de que a dor não é normal. "Antes acreditava-se que a dor era só um sinal de alerta e que tinha que tratar a causa. Mas, em algumas patologias, como a dor nas costas, isso não é possível. Tem que tratar a dor."



domingo, 23 de maio de 2010

Distúrbios Funcionais

Em 1990, um grupo de pesquisadores ligados ao Departamento de Medicina da Universidade de Ciências da Saúde em Bethesda, EUA, realizou um estudo da prevalência de sintomas em pacientes ambulatoriais, e a eficácia dos tratamentos utilizados.

Observaram que “Sintomas comuns são importantes causas de adoecimento e de
utilização de serviços de saúde.” Por meio de um questionário respondido por 410 pacientes ambulatoriais, avaliaram 15 sintomas. Os pacientes relataram quais eram os seus principais problemas de saúde, e que terapia (se havia alguma) era útil. Enquanto 80% dos pacientes com síndromes dolorosas e queixas gastrintestinais obtiveram algum benefício terapêutico, somente 39% dos indivíduos com fadiga, dispnéia, vertigem, insônia, disfunção sexual, depressão, e ansiedade relataram qualquer alívio.
Concluíram os autores que “são necessários melhores tratamentos para essas queixas comuns dos pacientes ambulatoriais.”

Em meados do século 19, alguns médicos defendiam o conceito de "neuroses" como doenças nervosas sem causa orgânica aparente, e outros duvidavam. Perguntavam: não seriam os distúrbios neuróticos mais bem explicados como doenças imaginárias de pacientes que buscam atenção?

Mais recentemente, Yunus (co-autor dos critérios de diagnóstico da síndrome de fibromialgia para a Academia Americana de Reumatologia), propôs o termo “distúrbio de espectro disfuncional” para descrever condições como síndrome de fibromialgia e síndrome da fadiga crônica, síndrome do cólon irritável, dor facial atípica, bexiga hiperativa, entre outras.

Em seguida apareceu o conceito de distúrbios neurossomáticos, termo que descreve condições atribuídas a alteração da função límbica, incluindo distúrbios do humor, como ansiedade .

Distúrbios neurossomáticos são definidos como disfunções da rede neural com repercussões sistêmicas, causadas por uma interação de fatores genéticos, do desenvolvimento e ambientais. Incluem alterações da captação, da transmissão, do processamento de informações no sistema nervoso, e dos padrões de comandos da rede neural.

O reconhecimento da neurobiologia desses distúrbios representa novas possibilidades terapêuticas para essas condições. Nos distúrbios funcionais como na resposta ao stress, ocorre modulação periférica de receptores e efetores, sensibilização e wind-up no aspecto central. A restauração do padrão fisiológico de configuração da rede neural depende de um aprendizado, semelhante ao que induziu a patologia.
Psicoterapia, medicamentos e neuromodulação induzida por estimulação neural periférica são recursos eficazes para o tratamento dessas condições clínicas.




Sintomas mais comuns, e a proporção de causas orgânicas identificáveis.

 
1. Kroenke K, Arrington ME, Mangelsdorff AD. The prevalence of symptoms in medical outpatients and the adequacy of therapy.Arch Intern Med. 1990 Aug;150(8):1685-9.
2. Yunus M.B. Towards a model of pathophysiology of fibromyalgia: aberrant central pain mechanisms with peripheral modulation. J Rheumatol 9:846-850. 1992
3. Goldstein J. A. Betrayal by the Brain: the neurologic basis of chronic fatigue syndrome, and neural network disorders. The Haworth Medical Press, NY/USA, 1996

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Acupuntura diminui a ansiedade do tratamento dentário

O medo de ir ao dentista impede muita gente de fazer o tratamento dentário que precisa, mas uma pesquisa recente mostrou que a Acupuntura proporciona alívio rápido dessa forma de ansiedade.

Uma em cada 20 pessoas sofrem de odontofobia severa, e 30% da popuylação em geral tem asiedade moderada quando se trata de ir ao dentista, segundo os pesquisadores.

Alguns tratamentos disponíveis, como distração, técnicas como distração, relaxamento, traqilizantes e sedação podem consumir muito tempo e produzir efeitos colaterais. Além disso, o Dr. Palle Rosted, do Departamento de Oncologia do Weston Park Hospital em Sheffield, Inglaterra, para muito pacientes aqueles tratamentos não são suficientes.

A Acupuntura é um ferramenta extraordinária para os dentistas.

O grupo liderado pelo Dr. Rosted testou o tratamento por Acupuntura em 20 pacientes com média de idade por volta dos 40 anos, com odontofobia há mais de 30 anos. A ansiedade foi avaliada antes, e cinco minutos depois da aplicação de cinco agulhas no alto da cabeça dos pacientes, através do questionário conhecido como Beck Anxiety Inventory (BAI).

A média dos escores do BAI caiu de 26.5 para 11.5 depois da Acupuntura, e todos os pacientes puderam tranquilamente receber o tratamento dentário. Antes da intervenção, somente seis dos pacientes conseguiam tolerar qualquer tratamento dentário, em sessões que demandavam grandes esforços dos pacientes e dos dentistas.

Do ponto de vista científicoficou demonstrado que 70% dos indivíduos apresentaram bons resultados e, disse o Dr. Rosted "Do ponto de vista prático, e isso é o que realmente importa, demonstramos que é possível realizar o tratamento dentário planejado, para qualquer paciente."


Segundo o cientista, o tratamento "é seguro, rápido e de baixo custo". No estudo realizado pela sua equipe, os dentistas puderam começar o tratamento cinco minutos depois da inserção das agulhas.


Rosted P, Bundgaard M, Gordon S, Pedersen AML. Acupuncture in the management of anxiety related to dental treatment: a case series. Acupuncture in Medicine 2010;28:3-5.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Tratamento com Acupuntura para dor associada a procedimentos médicos e agitação em crianças

mostra uma aplicação muito interessante da Acupuntura, num cenário ideal, de amplo uso hospitalar dos recursos da especialidade.
Entretanto, há uma falha, que acontece na maior parte dos estudos clínicos que testam hipóteses da prática tradicional chinesa. 
É a falta de definição do que é um “ponto de acupuntura”. Dizem os autores que num estudo animal foi usado o ponto HT7, que em humanos dá acesso ao nervo ulnar na altura do punho. Seria idêntico em termos neuroanatômicos o análogo em animais (que animais?)?
Seria exclusividade do ponto HT7 o efeito calmante? 
Estudos com diversos locais de estimulação mostram efeitos de desligamento da resposta ao stress por via gabaérgica mostram resultados semelhantes, e segundo Han Ji Sheng, para nervos que se situam assim próximos da superfície, eletroneuroestimulação transcutânea é suficiente para produzir os mesmos efeitos, com muito menor desconforto para o paciente, comparando com punção com agulha, que sempre pode ser doloroso.

 

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Defensores da acupuntura tradicional chinesa afirmam que resultados terapêuticos dependem dos aspectos ritualístico e do efeito placebo


Tao Liu (Traditional Chinese Medicine Department, The 2nd Teaching Hospital, Jilin University, 218 Ziqiang Street, Changchun 130041, Jilin Province, P.R. China), defende no seu artigo “Acupuncture: What Underlies Needle Administration?” publicado em eCAM 2009; 6(2)185–193, que Acupuntura é mesmo placebo, e que assim deve ser assumida pelos profissionais.
Tudo para manter a Acupuntura sob domínio étnico-cultural e político.
Trechos comentados:
  • To better understand acupuncture, we have to turn to its traditional Chinese medicine (TCM) theory origin.
Na verdade, para melhor compreender a Acupuntura é preciso considerar os diversos processos neurobiológicos envolvidos nos efeitos terapêuticos.
  • Acupuncture is a treatment modality of TCM that developed a different conceptual and theoretical basis to that of modern western medicine (1,2).
As bases teóricas e conceituais da medicina tradicional chinesa não resistem a uma apreciação isenta. A anatomia é imaginada, a fisiologia é produto de uma indução que parte de uma peculiar representação do mundo. Para preencher a falta de noção da existência do sistema nervoso, criou-se um sistema de canais percorridos por uma energia vital – os chamados meridianos – metáfora que parte de uma modelagem matemática, resultante do arranjo proporcionado pelo logaritmo de 3 na base 2 (Yang e Yin).
  • TCM focuses on the inseparability and unity of the mind and the body, mental and emotional factors being inextricably linked with physical processes in maintaining health and precipitating illness (3).
Afirmação falsa. Em todas as épocas e civilizações foi percebida a interação mente-corpo, mas as explicações de que se dispõe hoje para essa “unidade” ou interatividade eram inacessíveis até recentemente.
Na medicina tradicional chinesa, os aspectos psíquicos (espírito, alma) são segmentados, e cada modalidade tem sede num dos órgãos internos, deles se separando com a morte, sendo, portanto, entidades separadas, temporariamente reunidas. Segundo a teoria as doenças podem afetar o espírito ou o corpo separadamente.
  • Without this basic consideration, any appropriate approach to investigating the mode of action of acupuncture can by no means be made.

Como considerar o modo de ação da acupuntura sem passar pelas respostas neurais à estimulação?
  • In terms of nature of administration, acupuncture is an invasive, painful, and ritually and technically sophisticated intervention. Prior studies suggest that invasive, uncomfortable, and painful interventions tended to enhance placebo responding (18,39), and that individuals are more likely to demonstrate a placebo effect when they are feeling anxious than when they are not feeling anxious (45,46). Here, consistent with a prior behavioral study (7), it is suggested that this invasiveness/anxiety-placebo relationship is due to that invasiveness induced fear and anxiety enhances treatment effects through heightening somatic focus (highly focused and spatially directed attention in the case of acupuncture).
Quer dizer, o autor afirma que sem o efeito-placebo o agulhamento é inútil. A intervenção é dolorosa e desconfortável, mas sobretudo ritualística, do seu ponto de vista.
Desconsidera as fibras nervosas na periferia corporal, e nem imagina que a intervenção possa ser não-dolorosa, quando se selecionam receptores não-nociceptivos.
  • When the majority of RCTs of acupuncture fails to show effects beyond a placebo response, acupuncture has been dismissed as nothing more than placebo (17). But if acupuncture is a pure placebo and perceived effects of acupuncture are mere a placebo response with needle insertion playing no role at all, we have to face the question of how clinic provision of acupuncture can produce such a powerful placebo effect and why acupuncture is provided in such a sophisticated manner.
Neurophysiological and neuroimaging studies on eCAM 2009;6(2) 191 acupuncture will promise to cast direct light on the neurobiological mechanisms that are involved in acupuncture, and beyond acupuncture, the mechanisms of complex placebo phenomenon, not only for pain but also for other conditions.
Enquanto o comprometimento com a MTC não permite o entendimento de que acupuntura seja um conjunto de métodos de estimulação e modulação neural, despreza-se a quantidade de evidências da neurobiologia desses métodos. A razão disso é que ao admitir as bases anatômicas e fisiológicas, esses métodos terapêuticos deixariam de ser patrimônio étnico para se universalizar.

domingo, 22 de novembro de 2009

Mudança de paradigmas e a forma da estrutura de poder



A mudança de paradigmas científicos não depende da superioridade das novas formas de entendimento e novas técnicas sobre as formas tradicionais, tanto em termos de compreensibilidade, transmissibilidade e reprodutibilidade, quanto em termos de proporcionar o desenvolvimento de novas tecnologias muito mais precisas, objetivas e eficazes do que as antigas.
Normalmente, quando são demonstradas vantagens significativas do uso de novas práticas, técnicas e tecnologias, estas tendem a ser adotadas cada vez mais amplamente. Mas quando as mudanças paradigmáticas envolvem mentalidades, ideologias, dogmas, crenças, então o tempo e o modo de se concretizarem é diferente, principalmente quando estão em jogo interesses de pessoas e grupos de pessoas que visam preservar uma estrutura piramidal e coerciva de poder.
O progresso e as melhorias permanecem secundários às estruturas conectivas estabelecidas pelos detentores do Saber Oficial. Essas relações interpessoais têm uma forma geométrica rígida – a de uma pirâmide, da qual o vértice abriga o poder supremo, e cujas arestas sustentadas diretamente por essa emanação coercitiva, garantem a estabilidade e a rigidez do conteúdo.
O conteúdo, composto por pessoas submetidas a milênios de estruturação idêntica – como nas famílias, nos feudos, nas escolas, nas empresas, e nas nações, e que tiveram essas memórias reforçadas por treinamento presente, perde liberdade. As pessoas se tornam incapazes de exercer criatividade, de se tornarem empreendedores, o que traria benefícios coletivos.

Conceber o futuro
O futuro do ambiente das organizações está na descentralização, no abandono do modelo piramidal, permitindo a manifestação do empreendedorismo endógeno.
O novo modelo de organização, que perde a rigidez da forma geométrica definida se assemelha mais aos sistemas de computação em nuvem, em que as hierarquias são imprecisas, e não há um poder central, mas sim um comitê gestor que é antes facilitador do que repressor. Assim, encorajam-se opções e inovações e o senso de oportunidade; favorece-se o empreendedorismo, cuja base é a concepção do futuro.
Distribuir informação e proporcionar o debate livre e incentivar ações que ampliam horizontes são essenciais para a adaptabilidade e logo para a evolução.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Reflexão Sobre a Evolução da Acupuntura

Recontextualização


O trabalho científico começa
quando o significado das palavras e dos conceitos
é circunscrito com precisão.
Gaston Bachelard

A Acupuntura, até 50 anos atrás, era uma cura exótica, muito em voga no auge da belle époque. Na época, certos círculos cultivavam o gosto – típico do Romantismo, movimento expressivo da modernidade, pelo místico, misterioso, espiritual e “do além”. O impressionismo, a chinoisérie, tinham, como ecoam muitos círculos ainda hoje, vínculos com uma nova Weltanschaung (visão do mundo), que a modernidade exigia.

A atração pelo Oriente mágico, de raízes antigas, se relaciona com a longa presença dos Califados na Península Ibérica. A proximidade posterior do Império Turco-Otomano, que impressionava a Europa, reforçou os laços, que logo se converteram em presença física maciça de contingentes europeus no Extremo Oriente – todos os países da Europa ocidental acabaram invadindo, literalmente, a China.

Nos seus inícios, a prática da Acupuntura no Ocidente foi marcada, em muitos casos, por um traço esotérico e/ou místico. Entretanto, na atualidade, são exigidos outros padrões de explicações e de evidências da eficácia de qualquer método terapêutico.

O modelo da Medicina Baseada em Evidências não representou uma ameaça para a Acupuntura, mas sim um reforço da validade e da certeza da sua aplicabilidade em muitas condições clínicas.
Algumas questões, entretanto, ainda estão por ser mais bem respondidas. As pesquisas clínicas, as investigações sobre as mudanças bioquímicas produzidas sob efeito da Acupuntura consolidam a Acupuntura como Ciência12.

Mas ainda é preciso que se proceda a uma crítica dos fundamentos da prática e das técnicas, para esclarecer – O que é “energia vital” e do que é “canal energético” ou “meridiano”; Como a doutrina dos 5 elementos pode ser assimilada aos princípios científicos contemporâneos; A natureza dos fenômenos que intervêm quando se efetua uma punção Acupuntural, e da natureza dos mecanismos de ação possíveis.

As influências do progresso científico recente marcam diferentes fases da Acupuntura atual, como mostra o quadro evolutivo das últimas décadas identificando uma trajetória que progride para a integração:

1930        Energia vital
1950        Eletricidade   
1960        Gate control
1970        Neurotransmissores   
1980        Neurofisiologia da Dor
1990        Distúrbios Neurossomáticos / A Rede Neural
2000        Neuromodulação
2010        Intervenções baseadas em dados anatômicos e funcionais

Questões epistemológicas

O conceito de Qi, e sua tradução por “energia”
O que é esta “energia” que circularia eletivamente ao longo dos meridianos?
A teoria dos fluidos e dos eflúvios, como foi demonstrado há tempo, está superada, mas a ciência contemporânea oferece ferramentas conceituais e tecnológicas para o estabelecimento de novos postulados.

Quais as conseqüências fisiológicas da punção de um ponto de Acupuntura?
Alterações químicas locais? Estimulação de fibras nociceptivas? Qual é o papel do sistema nervoso e do cérebro nas respostas? Como se dão as relações entre Meridianos e funções internas? Trata-se de manipulação de um “fluido vital”, “magnético”, “energético”? Ou introdução de sinais biológicos, instrução, informação? A ação da Acupuntura se dá no componente energético ou cibernético do organismo?

Piaget explicou que sem dúvida, as razões da resistência do vitalismo estiveram sempre ligadas às insuficiências da explicação mecanicista no momento da história em que tem lugar a discussão. “A dupla função histórica do vitalismo foi pois levantar problemas, o que é excelente, mas também foi prestar-se a tapar buracos, o que já é mais discutível. Apenas, por que tapá-los com uma noção tão venturosa como a de ‘força vital’? É porque evidentemente a experiência interior fornece-nos esse modelo”.

Pode-se ainda trabalhar com o conceito de elemento, interpretado como “energia” ou como “matéria”? Quando se fala em energias patogênicas, ou “perversas”, e associamos tais entidades a fluidos, isto representa um retrocesso cultural e uma negação da ciência, uma adesão a um modelo interpretativo esotérico e obscuro.

Como resposta a essas questões, não se pode aceitar uma resposta simplista como “É verdade porque funciona”. A Acupuntura, para que possa vir a ser uma ciência do futuro, ou mesmo uma ciência de futuro, precisa superar o seu passado. Removendo do seu discurso o peso do ocultismo e do esoterismo, tomando consciência do papel das imagens e metáforas, as quais são como “uma luz fraca”, para então buscar as inferências fortes, base da Ciência como modo universal de conhecimento.

A verificação efetuada nos testes clínicos, a pesquisa das modificações induzidas no organismo pela Acupuntura,  a aproximação com a Neurofisiologia e a busca da contemporaneização dos conceitos são os meios para fundar a Acupuntura como Ciência.

Para facilitar a superação dos obstáculos no caminho da integração da Acupuntura nas práticas correntes da medicina moderna, é preciso identificar esses obstáculos e seus motivos, procedendo então a sua neutralização.

sábado, 29 de agosto de 2009

A dor desconsiderada e não-tratada


Artigo de utilidade pública:


“Procedimentos medievais”, por Drauzio Varella
na Folha de S. Paulo

Reproduzo trecho:

Antes da descoberta da anestesia, é compreensível que a medicina desse ouvidos à ideologia estúpida de valorização do sofrimento. Diante da dor, o que podia dizer o médico além de recomendar coragem, determinação e bolsa de água quente?
Mas conviver com a dor na prática diária em pleno século 21, sem fazer uso da melhor tecnologia para aliviá-la, é voltar aos tempos medievais.
........

Dispomos de analgésicos potentes e de anestésicos de ação rápida que permitem acordar o enfermo imediatamente ao final da intervenção. Se é considerado desumano o profissional que deixa de medicar uma pessoa com dor, qual a justificativa para submetermos alguém a um procedimento que irá provocá-la, sem tomarmos as devidas precauções?
........
Endoscopias, implantes de D.I.U., manipulações de pacientes traumatizados sem analgesia, o problema não é exclusivo da medicina brasileira. Biópsias de próstata sem anestesia são realizadas todos os dias em alguns dos melhores centros americanos e europeus, com a mesma justificativa: dá para suportar!

Dá para suportar quer dizer exatamente o quê? Que ninguém morre de dor? Se nossos Conselhos Regionais considerarem comportamento antiético indicar intervenções como essa a sangue frio e punirem os profissionais e as instituições que insistirem na sua realização, teremos dado um passo importante para tornar mais humana a prática da medicina, profissão que tem como finalidade aliviar o sofrimento humano.

domingo, 23 de agosto de 2009

Modelos Representativos de Doença e Cura - 1. A Representação da Doença

Os sistemas médicos se baseiam em modelos, que delimitam as possibilidades de interpretação dos fatos. Esse estabelecimento de limites é determinado por um sistema de idéias, uma ideologia, que é inseparável do momento cultural da civilização em que se desenvolveu, e pressupõe que fora desses limites, o que existe é “irracionalidade”. Esta intolerância à diversidade representa uma restrição da variedade, pode ser traduzida como redução da quantidade de informação. Assim, a adoção de um determinado paradigma pode resultar num obstáculo para os avanços em eficácia.

Por outro lado, a cultura biomédica não é isenta de representação do imaginário e do social. Todo discurso sobre a doença procede de uma opção teórica, e está subordinado, como qualquer aspecto do pensamento, à cultura, à civilização e à época em que se inscreve.

As formas elementares da doença - os modelos etiológicos.

Quando se observa os modelos etiológicos elaborados ao longo do tempo, apresentam-se duas grandes tendências:

1, As medicinas centradas na doença, cujos sistemas de representações são comandados por um modelo ontológico de natureza física;

2, As medicinas centradas no homem doente e cujos sistemas de representação são comandados por um modelo relacional que pode ser pensado em termos fisiológicos, psicológicos, cosmológicos ou sociais.

Os modelos descritos a seguir, numa forma idealizada por François Laplantine, em “A Antropologia da Doença”, são dispostos em pares de oposições, que descrevem e comparam as vertentes - ontológica X relacional, exógena X endógeno, e aditiva X subtrativa.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

As práticas integrativas e complementares

A denominação Práticas Integrativas e Complementares inclui uma lista de métodos terapêuticos que, apesar de serem eventualmente confundidos entre si como se compusessem uma unidade, são muito diferentes, como a Acupuntura, a Homeopatia e a Fitoterapia. Embora distintos em termos de fundamentos teóricos e de prática, igualam-se nos fatos de não estarem integrados no contexto médico-científico, sendo assim considerados alternativos, não-convencionais ou complementares e, portanto, como não sendo não de primeira linha.

A Acupuntura, a Homeopatia e a Fitoterapia são componentes centrais entre as práticas integrativas e complementares. Para muitos setores, ainda não está claro como funcionam, e qual a aplicabilidade clínica desses recursos terapêuticos.

Esses métodos representam uma ruptura com as concepções vigentes de saúde, doença e terapêutica. São descritas - segundo uma doutrina sociológica - como vinculados a “racionalidades médicas” diferentes, que se justificam pela longevidade, ou por pertencerem ao domínio do tradicional ou da sabedoria popular.

Mas a sua validade científica é questionada, com razão, porque as explicações e as comprovações da eficácia e da segurança no seu uso, algumas dúvidas ainda não forma devidamente esclarecidas.

Setores tradicionalistas sustentam a idéia de que algumas desses recursos terapêuticos constituem “sistemas médicos”, mais do que simples métodos terapêuticos. Mas como advertiu Claude Bernard há cerca de 150 anos, não há mais espaço para sistemas médicos, ou para “Medicina com sobrenome”, como escreveu.

Assim, a oferta das chamadas práticas integrativas e complementares no Sistema Único de Saúde também pressupõe uma convivência destas com os procedimentos convencionais, embora haja um aparente conflito entre os dois modelos,

Para compreender melhor essa constelação de questões, uma das ferramentas úteis é a análise dos diferentes modelos representativos de saúde, doença e cura que se desenvolveram historicamente.